Há pelo menos 12 dias, o fogo atinge diversas regiões do Parque Nacional da Chapada Diamantina (PNCD), no interior da Bahia. Mais de três mil hectares já foram queimados, de acordo com levantamento feito pela BRAL (Brigada de Resgate Ambiental de Lençóis), via imagem de satélite e observação. A situação continua se agravando.
Diante da situação definida como dramática, a BRAL cobra do poder público que medidas preventivas sejam tomadas para evitar os incêndios, que nos últimos anos tornam-se cada vez mais frequentes. “Atualmente, observamos incêndios anuais, bienais ou trienais em áreas onde ocorria a queimada natural a cada 30, 40 ou 100 anos”, constata Diego Serrano, engenheiro florestal e representante da BRAL no conselho municipal de meio ambiente.
Para ele, “o fogo natural é um fator, no entanto, o que vem ocorrendo na região do PNCD é um impressionante aumento na frequência e na recorrência desses eventos, devido a causas não naturais ou ao fogo antrópico (causado por humanos). E esse aumento tem se mostrado muito superior à capacidade de recuperação dos ecossistemas afetados”.
A Brigada atua há 15 anos de forma voluntária no combate a incêndios florestais na região e, neste momento, já mobilizou mais de cem moradores no combate. Por isso, defende três pontos fundamentais que precisam ser discutidos para evitar novos danos ao meio ambiente: investigar e reprimir as causas; investir em monitoramento e dar apoio efetivo para as brigadas.
É necessário chamar a atenção para os problemas estruturais que envolvem a questão. Segundo Feijão (Jânio Souza Rocha), coordenador de operações da brigada, “a economia do turismo não inclui todos os moradores, por isso, existem indícios que os incêndios ainda sejam causados, em muitos casos, por atividades como o garimpo, criação de animais e a extração de plantas”.
Na Chapada Diamantina nunca houve uma condenação por incêndios florestais, o que está relacionado à falta de infraestrutura do governo do estado para a investigação, que é de responsabilidade da Polícia Civil. A BRAL acredita que não só a impunidade contribui para a manutenção dos incêndios, mas, também, a ausência de políticas públicas para a inclusão social e conscientização ambiental dos autores dos crimes.
Falta de monitoramento
O período de queimadas ocorre entre os meses de agosto a novembro e, mesmo assim, não há nenhuma política de monitoramento realizada por parte do ICMbio (Instituto Chico Mendes de proteção da Biodiversidade), órgão responsável pela administração dos parques nacionais. “Houve uma experiência iniciada em 2005 com o plantão de brigadistas em pontos de observação, reduzindo consideravelmente a dimensão das queimadas. Porém, nos anos sequentes, quando o trabalho foi suspenso, ocorreu em 2008 o pior incêndio registrado na história da região, quando 50% do parque foi atingido. Porém, o ICMbio alega que neste ano o que contribuiu foi a falta de chuvas, mas temos diversas testemunhas que participaram do trabalho de monitoramento e contestam a afirmação”, afirma André Valladão, brigadista voluntário há 10 anos.
Além disso, a BRAL denuncia a falta de continuidade de políticas e o desperdício de recursos públicos. “Nesse mesmo período, também foi implantado um sistema de rádio dentro da unidade de conservação, porém as torres estão todas abandonadas e os equipamentos se deteriorando”, destaca o brigadista.
Dessa forma, todos os esforços de proteção e conservação do PNCD são literalmente queimados, como projetos de reflorestamentos e recuperação das matas ciliares, que custam milhões de reais e demoram mais de 100 anos para se recuperar. “Tudo se perde em algumas horas de fogo”, ressalta Serrano.
O engenheiro ambiental e membro da equipe técnica da BRAL, Rodrigo Valle, defende também medidas de educação ambiental para moradores e turistas e a implantação de tecnologias de controle do fogo, como aceiros e barreiras de contenção. “Infelizmente, o montante dos recursos acaba sendo destinados para a emergência, só neste caso já foram R$ 6 milhões, enquanto a prevenção recebe uma parcela muito menor”, destaca.
Infraestrutura inadequada para o combate
Os brigadistas afirmam que o apoio dado pelo poder público é insuficiente. Existe um sério problema de logística. As brigadas voluntárias não possuem veículo próprio, nem aparelhos de telecomunicação e a quantidade de EPI (Equipamento de Proteção Individual) não é suficiente para todo o efetivo, impedindo a atuação de muitos voluntários.
“Algumas vezes o foco fica a mais de 10 horas de caminhada e o acesso e a obtenção de água também dificultam a situação, obrigando os voluntários a permanecerem, às vezes, vários dias acampados perto do incêndio”, ressalta o engenheiro florestal, Diego Serrano.
Além disso, o diálogo entre as diversas brigadas e os órgãos oficiais é ineficiente. O trabalho acaba sendo feito de forma desordenada devido à falta de comunicação. “Cada equipe vai para uma localidade, não existe contato com as brigadas por parte do ICMbio. Nós definimos sozinhos a estratégia de atuação, o que dificulta mais o trabalho”, conta Valadão.
“O helicóptero do governo do estado não trabalha em parceria com as brigadas, apenas depois de muita pressão. Geralmente, colocam a aeronave a nossa disposição nos últimos dias do incêndio”, afirma Marta Ferreira, brigadista e sócia-fundadora da BRAL. “Esta noite, inclusive, dois brigadistas sofreram acidente e fizemos sinal de socorro e o helicóptero não realizou o resgate”, acrescenta Valladão.
O combate funciona de forma precária, com o apoio da comunidade, que doa alimentos e disponibiliza seus veículos. Além disso, os brigadistas afirmam que o trabalho é insalubre e perigoso, decorrente das áreas extremamente silvestres e a exposição em excesso a fumaça. “A maior parte dos voluntários atua há anos e não possuem nenhuma espécie de seguro de acidentes, dois brigadistas já morreram em combate”, lembra o coordenador de operações.
Galeria de Fotos | Por Açony Santos